Notícia publicada no Jornal A Tribuna de 31/10/2004 - página A-14.
Transcrição do jornal.
O FATO HISTÓRICO, OCORRIDO HÁ 118 ANOS CONSTA DE LIVRO-ATA GUARDADO NA CÃMARA.
Há exatos 118 anos, a Câmara da Vila de São Vicente acabava com a escravidão no Município, um ano, seis meses e 13 dias antes de ser assinada a Lei Áurea pela Princesa Isabel. Um Livro-Ata que hoje se encontra no arquivo da Casa, mostra que a decisão foi tomada em comemoração à morte do Conselheiro José Bonifácio. No mesmo livro, no dia 14 de maio de 1887, a Câmara aprovou a denominação de 31 de Outubro para uma rua paralela à Rua Padre José Anchieta. Trata-se da Rua Tibiriçá, no Centro da Cidade.
Quem descobriu a existência da lei foi o assistente administrativo do Arquivo da Câmara, Narciso Vital de Carvalho. Em 13 de julho de 1993, o então prefeito Luiz Carlos Luca Pedro sancionou a lei que oficializou o dia 31 de outubro de 1886 como o Dia da Libertação dos Escravos em São Vicente.
Além de estabelecer a data comemorativa, o Executivo ainda propôs a realização anual de palestras e eventos alusivos à data em toda a rede municipal de ensino.
O autor do projeto de Lei nº 36/93 que deu origem à promulgação foi o vereador Ricardo Verón Guimarães. Conforme ele enfatizou no documento, a decisão tomada em 31 de outubro de 1886 “manifestava o engajamento (da Vila de São Vicente) no processo abolicionista que culminou com a assinatura da Lei Áurea em 1888”.
No mesmo documento, Guimarães destacava a existência de duas canetas, utilizadas pela comissão encarregada da libertação dos escravos e cuja futura importância foi lembrada na ocasião.
Assim se referiu às canetas a comissão: “Na verdade, são dois objetos que nada valem hoje, mas que forçosamente hão de valer muito daqui a alguns anos, quando nosso País tiver a felicidade de ver retirado de si o cancro negro da escravidão...”.
As canetas e as penas não se encontram mais na Câmara. Segundo a presidente do Grupo Cultural Herança Negra, Hilma Vidal, que pesquisou o assunto, elas provavelmente se perderam durante mudanças ocorridas na Casa.
Pesquisa
Hilma destaca a importância da pesquisa realizada pelo assistente administrativo Narciso Vital de Carvalho. “Se ele não tivesse feito o levantamento, ninguém saberia desse fato”;
Por conta da descoberta, conforme conta o diretor cultural do grupo, Cal da Viola, Carvalho será homenageado com a dedicação de um monólogo que será apresentada durante a Semana da Consciência Negra, de 18 a 20 de novembro. (2004).
Cal destaca que, na época em que foi decretada a libertação dos escravos, já existia o movimento abolicionista no País. “Mas o que mais chama a atenção é que isso se deu antes da Lei Áurea”.
Segundo o presidente do Instituto Histórico e Geográfico de São Vicente (IHGSV), Fernando Martins Lichti, na época em que a lei foi assinada na Vila, os escravos que aqui existiam já eram mestiços. “Eram filhos de escravos, nascidos aqui”. A maioria trabalhava no campo, nas lavouras de arroz e cana-de-açúcar, mas haviam também os escravos domésticos.
Ainda hoje, alguns locais da Cidade revelam a passagem deles, como a construção ao lado da bica situada na Avenida Minas Gerais, na Vila Voturuá, próximo à linha Vermelha. Conforme a presidente do Herança Negra, o lugar era reduto de escravos durante o Império.